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Policiais e juristas avaliam os impactos da Lei de Abuso de Autoridade

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Em vigor desde 3 de janeiro deste ano, as mudanças na lei número 13.869, conhecida como Lei de Abuso de Autoridade, causam debates entre os agentes públicos. Mesmo com tanta divergência sobre o texto, o Congresso declara na legislação 45 condutas que passam a ser consideradas crimes (veja todas no quadro). Uma das alterações é o veto de divulgação de fotos de suspeitos, mesmo que esteja de costas ou que seja apenas uma parte do corpo. A justificativa é que eles podem ser identificados (por algum sinal, pinta, tatuagem, etc) e, assim, passarem por situação de constrangimento. 

O delegado regional da Polícia Civil, Sandro Meinerz, diz que uma revisão na lei era necessária, pois a legislação anterior foi promulgada em 1965. Contudo, ele opina que o novo texto tem trechos "mal redigidos" e é muito focada "no indivíduo e não na sociedade". Meinerz, que também é professor universitário de Direito Penal, comenta que as mudanças vão afetar o trabalho da polícia e cita a proibição de ouvir depoimentos de suspeitos durante o chamado repouso noturno.

- Fico preocupado, os crimes não ocorrem só das 8h às 18h. E outra coisa, o repouso noturno é um em Santa Maria, outro em Polêsine e, outro, em Porto Alegre, mas a lei é geral, para todos. Acredito que vai causar morosidade nos processos. A nova lei olha muito para o indivíduo e não para a sociedade. Não concordo. A própria lei cria problemas - avalia o delegado.

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Meinerz teme que as alterações afetem diretamente o dia a dia da polícia, já que alguns agentes poderão evitar certas condutas com medo de represálias e penalidades. Ele destaca que isso não quer dizer que os policiais hoje em dia cometam abuso de autoridade, mas que com a nova legislação, as penalidades estão mais severas e com amplo entendimento e, por isso, os agentes podem se negar a certas atitudes.

Enquanto o delegado regional da Polícia Civil se preocupa com os efeitos na rotina dos agentes, o capitão da Brigada Militar Luis Sandro Martins, que está respondendo pelo Subcomando do 1º Regimento de Polícia Montada (RPMon), diz que a nova lei não muda o trabalho diário dos policiais. Segundo ele, a Lei de Abuso de Autoridade já existia e a premissa é que todos os agentes públicos já atuam "dentro do que é correto", por isso não altera o cotidiano.

AVALIAÇÃO
Já o advogado e juiz aposentado Alfeu Bisaque Pereira diz que a lei tem aspectos positivos e negativos, e que fala de coisas óbvias. Ele cita o trecho "impedir que um juiz prenda alguém ilegalmente" como exemplo de obviedade. 

- Um juiz nunca prendeu alguém ilegalmente. Mas tem algumas coisas que são relevantes, que estão deixando mais clara a conduta, por exemplo: a condução coercitiva, a lei proíbe. Mas a lei impediu que réus tenham seus nomes noticiados antes da denúncia. Por que as pessoas não podem ficar sabendo? - questiona Alfeu.

Além de mais crimes na lista, penalidades ficam mais severas
O advogado criminalista e professor universitário Daniel Tonetto diz que a nova legislação mudou muito a Lei de Abuso de Autoridade, com pontos positivos e negativos. Para ele, os agentes públicos podem ser os mais afetados por essas alterações, que endureceram as penalidades, o que inclusive pode ocasionar afastamento do cargo.  

Tonetto lembra que, no caso de um policial que não se identifica em uma abordagem, antes poderia ser penalizado entre 6 meses a 2 anos de reclusão. Agora, esse tempo pode ser de até 4 anos.

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Para o delegado regional da Polícia Civil, Sandro Meinerz, o aumento das penalidades também pode ser um motivo para que agentes públicos fiquem temerosos com a nova lei. Mas salienta que é preciso que sejam colocadas em prática, porque "a certeza da responsabilização é o que inibe" o abuso de autoridade.

Enquanto melhoria da legislação, Tonetto aponta a proibição de divulgar fotos de suspeitos. Ele conta que já defendeu pessoas em processos que levaram 7 ou 8 anos e os réus foram absolvidos. Porém, até a finalização da denúncia, a pessoa foi muito exposta e precisou mudar de cidade para conseguir recomeçar a vida.

TRECHOS DA NOVA LEGISLAÇÃO

Crimes punidos com detenção de seis meses a 2 anos 

  • Não comunicar prisão em flagrante ou temporária ao juiz
  • Não comunicar prisão à família do preso
  • Não entregar ao preso, em 24 horas, a nota de culpa (documento contendo o motivo da prisão, quem a efetuou e testemunhas)
  • Prolongar prisão sem motivo, não executando o alvará de soltura ou desrespeitando o prazo legal
  • Não se identificar como policial durante uma captura
  • Não se identificar como policial durante um interrogatório
  • Interrogar durante o repouso noturno, ou seja, à noite e de madrugada (exceções: flagrante ou consentimento)
  • Impedir encontro do preso com seu advogado
  • Impedir que preso, réu ou investigado tenha seu advogado presente durante uma audiência e se comunique com ele
  • Instaurar investigação de ação penal ou administrativa sem indício (exceção: investigação preliminar sumária devidamente justificada)
  • Prestar informação falsa sobre investigação para prejudicar o investigado
  • Procrastinar investigação ou procedimento de investigação
  • Negar ao investigado acesso a documentos relativos a etapas vencidas da investigação
  • Exigir informação ou cumprimento de obrigação formal sem amparo legal
  • Usar cargo para se eximir de obrigação ou obter vantagem
  • Pedir vista de processo judicial para retardar o seu andamento
  • Atribuir culpa publicamente antes de formalizar uma acusação

Crimes punidos com detenção de um a quatro anos

  • Decretar prisão fora das hipóteses legais
  • Não relaxar prisão ilegal
  • Não substituir prisão preventiva por outra medida cautelar, quando couber
  • Não conceder liberdade provisória, quando couber
  • Não deferir habeas corpus cabível
  • Decretar a condução coercitiva sem intimação prévia
  • Constranger um preso a se exibir para a curiosidade pública
  • Constranger um preso a se submeter a situação vexatória
  • Constranger o preso a produzir provas contra si ou contra outros
  • Constranger a depor a pessoa que tem dever funcional de sigilo
  • Insistir em interrogatório de quem optou por se manter calado
  • Insistir em interrogatório de quem exigiu a presença de um advogado, enquanto não houver advogado presente
  • Impedir ou retardar um pleito do preso à autoridade judiciária
  • Manter presos de diferentes sexos na mesma cela
  • Manter criança/adolescente em cela com maiores de idade
  • Entrar ou permanecer em imóvel sem autorização judicial (exceções: flagrante e socorro)
  • Coagir alguém a franquear acesso a um imóvel
  • Cumprir mandado de busca e apreensão entre 21h e 5h
  • Forjar flagrante
  • Alterar cena de ocorrência
  • Eximir-se de responsabilidade por excesso cometido em investigação
  • Constranger um hospital a admitir uma pessoa já morta para alterar a hora ou o local do crime
  • Obter prova por meio ilícito
  • Usar prova mesmo tendo conhecimento de sua ilicitude
  • Divulgar material gravado que não tenha relação com a investigação que o produziu, expondo a intimidade e/ou ferindo a honra do investigado
  • Iniciar investigação contra pessoa sabidamente inocente
  • Bloquear bens além do necessário para pagar dívidas

*Com informações da Agência Senado

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